A (des)conhecida

Dizem que o sorriso é o cartão de visitas de uma pessoa. Nunca a vi pessoalmente, descobri que ela existia através de uma rede social chamada BADO. Ela que me disse “sim” e chamou para conversar. “Garota de atitude” pensei, logo de cara. Enquanto ela perguntava alguma coisa sobre eu ser ou não escritor, eu estava anestesiado olhando as fotos dela. Tinham poucas, confesso, mas o número suficiente para eu clicar um “sim”, “agora”, “você”.

O sorriso dela era o mesmo em todas as fotos, isso para você que a vê de uma forma natural. Só que para mim tinha algo mais. Era um convite. Um convite para admirar o sorriso, passar pelos olhos, observar o contorno da boca e conhecer o coração. Ahn, meu amigo, ela tem um sorriso que é de parar o trânsito, uma praia, um mar inteiro. Então começamos a conversar, rolou uma sintonia, uma afinidade que até parece que nos conhecemos há meses, talvez anos. Ela falou um pouco do trabalho, da pessoa, da vida. Eu contei alguns hobbies, algumas piadas, alguns trechos do meu livro.

O jeito dela foi me encantando pouco a pouco, palavra por palavra. Do Bado para o Face, do Face para o Whatts. Pronto! Estava mais perto dela. Uma ou duas mensagens por dia, era muito pouco perto da minha vontade de conversar o dia inteiro e foi o que fizemos. Eu no meu trabalho, ela no dela. De manhã, de tarde, de noite e nos intervalos disso tudo.

Um dia desses, ela me mandou um áudio de bom dia, gostei tanto que queria sempre e adotei aquilo como parte da minha rotina. Um áudio, uma mensagem escrita ou foto, não importa. Qualquer coisa para demonstrar que eu estava gostando de conhecê-la e torcendo para que ela não desistisse do nosso encontro.

Sonhei a vida inteira com uma mulher romântica. Que soubesse valorizar e cultivar o amor de verdade. Que fosse bonita na sua simplicidade. Fosse engraçada sem contar piada. Gentil, sincera, meiga e uma qualidade que admiro muito em uma mulher: inteligente. Ela simplesmente conseguiu juntar todas essas qualidades em um único corpo. Qualidades essas que ela não foi me dizendo, mas fui percebendo só pelo jeito dela de falar, de me tratar, de agir.

Meu amigo, preciso te falar da voz dela. Cara, parece um chamado do céu. No primeiro áudio que ela me enviou foi um misto de arrepio com risada. Meu corpo inteiro ficou arrepiado e eu nem sei se foi de prazer ao imaginar ela dizendo algo romântico bem pertinho do meu ouvido ou se foi de emoção por parecer a voz de um anjo. Comecei a rir sozinho, mas era de felicidade por sentir que Deus estava me dando a oportunidade de conhecer alguém que provavelmente vai me marcar de alguma forma. Só não sei ainda como.

Numa dessas conversas, ela contou que sonha em casar na igreja. Com direito a coral e tudo mais. Enquanto ela contava, eu não acreditava que tudo que descrevia era tão parecido com o que eu mesmo sonhei e imagino para a minha vida.

Mas uma das melhores conversas mesmo foi falando sobre relacionamentos e textos antigos. Ela mostrou um texto que fez ao “ex” e eu me perguntei se aquele cara tinha algum problema na cabeça para deixar uma mulher como ela ir embora. Sim, porque nem preciso conhecê-la pessoalmente para saber o quanto é especial, doce, sensível, intensa, apaixonada! Está tudo bem ali naquelas palavras, no meio daqueles versos.

Estava tudo bom demais para ser verdade, mas em algum momento, no meio de uma palavra ou outro, algo mudou. As conversas começaram a ficar mais amenas, o interesse começou a diminuir e um desânimo inesperado começou a aparecer. Não sei direito como, nem o motivo disso, mas desconfio que foi algo no meio dela gostar de sair à noite e eu não. Alguma relação com o estilo musical e principalmente pelas milhas de distância que nos separa.

É que eu já sou um homem formado, não sou mais moleque. Não consigo conversar com uma mulher sem analisar o nosso grau de compatibilidade e pensar em um relacionamento sério. Ficar por ficar não é comigo. Beijar por beijar eu acho que não compensa. Gosto de ficar com pessoas que vão me agregar alguma coisa. Gosto de viver o hoje planejando o amanhã.

Estava tudo bem, puta merda! Ela é tão parecida comigo que chega a ser estranho. Está sempre encucada com as coisas e acha que algo errado está no ar, assim como eu. Tentei disfarçar, mas ela é esperta. Percebeu rápido e não hesitou em perguntar em que momento mudou do interesse para a falta dele.

Meio sem graça tive que responder com uma tristeza nos olhos. Em termos de sentimentalismo somos muito parecidos, mas os estilos de vidas são diferentes. De alguma forma, ela gostar de sair à noite serviu como um sinal de alerta e eu puxei o freio de mão. Nas vésperas da gente se encontrar pessoalmente, eu resolvi dar meia volta ao invés de seguir em frente. Resolvi recolher as fichas e guardar no bolso ao invés de jogar, apostar, tentar ganhar. Resolvi andar para trás ao invés de seguir em frente, recuei.

Sinto muito por ela e mais ainda por mim. Por deixar que uma diferença de gosto possa interferir tanto. A verdade é que tenho medo de tentar, arriscar, me magoar. Pelo sim e pelo não, eu opto pelo não. Na dúvida, eu desisto.

Poxa vida, nem acredito que estou fazendo isso. Ela continua com aquele olhar carente de carinho, aquela voz de mulherão e aquele sorriso que eu nem consigo parar de olhar. Ela continua doce e romântica, engraçada e inteligente. Ela simplesmente continua do mesmo jeito que me encantou na primeira conversa. Por que raios não pude deixar esses detalhes de lado e simplesmente curtir?

Sabia que queria não ser tão cismado com as coisas, sabia que uma hora dessas ia me prejudicar. Eu queria encontrá-la no domingo. Conhecer a dona daquele sorriso, daquela voz, daquele coração. Conversar pessoalmente, tocá-la e dizer o quanto ela é bonita por dentro e por fora. Devorar alguns pedaços de pizza e dar risada com as nossas conversas e brincadeiras. Sei que seria um encontro fantástico, mas estou bloqueado.

Não quero confessar que tenho medo de gostar demais dela porque eu me apego fácil. Vai que eu me apaixono, vai que eu entro de cabeça e não dá certo? Melhor evitar a possibilidade de me machucar. Eu nem curto muito sair à noite e a distância também não ajuda em nada. Como vou acompanhá-la? E se ela quiser sair toda às vezes sozinha? Não que ela seja uma baladeira de plantão. Talvez ela até abrisse mão disso, mas será que é justo a gente abrir mão daquilo que gostamos por alguém?

Na verdade, podemos nos moldar a forma de ser e agir do outro, mas mudar mesmo não. Acredito que para toda ação tenha uma reação. Optar por colocar o pé no freio pode significar o distanciamento dela. Lembro que fiquei um dia sem conversar com ela e foi o bastante para sentir saudade, isso porque nos conhecemos tão pouco.

Sei que existe uma sintonia, uma afinidade impossível de explicar com palavras. Sei que posso me arrepender por não ir a esse encontro no domingo. Posso perder a oportunidade de conhecer a dona daquele olhar, daquele sorriso, daquela voz e principalmente daquele coração. Posso perder tudo isso por medo de arriscar. De me entregar, me envolver. Na dúvida, estou tirando o pé do acelerador.

Tomara que os mesmos ventos que fizeram com que a gente se conhecesse nas redes sociais arrumem uma forma de voltar o interesse. Voltar a vontade e a coragem de remarcar esse encontro. Tomara que eu faça isso logo antes que ela perca o interesse. Antes que ela me tire a oportunidade de conhecer, enfim a mulher que sempre perambulou nos meus sonhos. Tomara.

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