Mocinhos e vilões

Não sou muito de televisão, mas algumas coisas me viciam. Nestes dias eu estava doida assistindo “Once upon a time” (um seriado que fala sobre contos de fada) e “Masterchef Brasil” (um reality show sobre culinária). E o mais legal é que os dois se complementavam.

Na temporada que eu acabei de assistir de Once upon a time, os vilões queriam seus finais felizes. Alguns se redimiram, como a Rainha Má que se apaixonou pelo Robin Hood, mas não conseguia ser feliz porque os vilões nunca têm finais felizes. E o Masterchef tinha mandado embora um cara polêmico, Fernando, exímio cozinheiro, mas com personalidade forte.

Primeiro, o que é ser mocinho e o que é ser vilão? Acho que já percebemos que essas coisas não existem, não é mesmo. Uma vez conheci um cara sensacional. Ele era divertido, muito gente boa. Ficamos amigos, ele era casado e tinha uma família linda e a mulher dele o amava e os filhos também. Eles viviam bem e eu adora ver como aquela família era feliz. Um dia, precisei deixar uma encomenda no trabalho dele e acabei escutando uma conversa de dois funcionários sobre o meu amigo “Nossa, ele tá de novo com o ovo virado. Como a mulher aguenta ele?” E tive vontade de intervir e dizer o quanto a mulher o amava e o quanto eles eram felizes, mas não tive muita reação. Ele era um herói em casa e um vilão no trabalho.

Nenhuma das duas coisas o definia, na verdade. Ele era só ele. E lá pelas tantas ele entendeu que, para ser ouvido no trabalho, precisaria ser duro. E isso é também uma medida subjetiva, na verdade, o que é ser durão? É ser firme? A cultura das empresas no Brasil ainda é muito complicada e qualquer “faz esse negócio direito” pode virar uma choradeira no banheiro, sem necessidade. Então o que?

O Fernando era assim. Focado, determinado. Eu não gostava muito do jeito dele, mas funcionava. O cara ganhou um monte de desafios, foi chefe de equipes e as coisas davam certo. Então ele estava errado. E ele não foi mandado embora por isso, ele acabou sendo eliminado porque realmente não estava num bom dia e fez um prato porcaria.

Nos contos de fadas, aquilo que aprendemos a ver como mundo, é sempre tudo oito ou oitenta. Ou as pessoas são boazinhas, ou são uns demônios. E pior, detestamos quando eles misturam os papéis.
Os índices de IBOPE de Babilônia, a última novela da oito onde os papéis de mocinho e vilão se misturavam, eram baixíssimos para o horário. Mas as novelas da seis, com mocinhas inocentes e vilões bem definidos, fazem sucesso. Sim, ainda temos dificuldade em perceber que as pessoas são o que ela são e aquilo é bom ou ruim para ela de acordo com as circunstâncias. 

Você mesmo já fez maldade, não fez? Já grudou chiclete na carteira do coleguinha ou colocou a culpa do vaso quebrado na sua irmã. Ou até coisas bem piores, não sei. Isso não faz de você alguém que não merece um final feliz, só faz de você alguém que está aqui, nesse planeta, aprendendo que nem todo mundo.

Não existe diferença. Somos todos um e somos todos iguais. O que muda é o nosso julgamento das pessoas e de nós mesmos. E isso é muito, muito perigoso. Isso gera culpa, que gera um montão de problemas. Mas isso é assunto para um próximo artigo. 

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